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Bruna Sena e Faissal Ellakkis |
O Brasil se renova. Quem vê a fumaça atual não percebe que não há mais tanta lenha.
Todos estão apavorados porque vemos cenas de terror, mais que de violência. Degolam-se os poderosos das classes altas, buscando maneiras de estancar a sangria: tentam mudar as leis, torcer para desastres de avião, nomear quem os possa salvar. Matam-se os poderosos das classes inferiores, degolando-se dentro dos presídios e promovendo o caos do lado de fora.
A garotada que vem aí, a que gosta de estudar, tem outra formação, outra visão de mundo.
Nós, os velhos, somos violentos. E mentimos, dizendo e pensando que não somos. E tentamos fazer de nossos filhos a reprodução de nossa violência. Até conseguimos tornar muitos de nossos jovens violentos também, mas esses serão minoria entre os que estão pouco a pouco chegando ao comando do país, por meio de vestibulares e concursos cada vez mais difíceis. O funil é apertado, e gradativamente começam a entrar nos postos de comando somente aqueles que estudaram muito, e que têm uma visão de sociedade bem diferente da nossa.
O primeiro lugar da Fuvest foi de uma aluna negra, pobre, e que teve a competência de ser estudiosa em meio a todo tipo de violência, da desigualdade ao preconceito. E conseguiu porque encontrou jovens professores com boa formação, uns mesmo mal remunerados no Estado, outros, conscientes estudantes da USP, voluntários, que se interessaram por alunos como ela e de graça lhes deram os cursos preparatórios.
A grande mídia pôs holofotes nos piores exemplos de jovens médicos, deformados, como o caso de Richam Faissal Ellakkis, que deu receita e aconselhou a matar a paciente Marisa Letícia. Mas não deu nenhum destaque à grande maioria de jovens engajados que estão saindo das universidades públicas para construir um país melhor do que esse que receberam dos mais velhos.
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Palhamédicos da UFTM |
Imagine se esse processo não fosse apenas resultado espontâneo de jovens que acordaram para a necessidade de mudar o país. Imagine se investíssemos realmente, de verdade, em educação, de forma sistêmica.
Ah, Darcy Ribeiro, vox clamantis in deserto: investir em escolas para não ter que investir em presídios. Se o Brasil fizesse, mesmo hoje, um plebiscito sobre dotação orçamentária, sem dúvida o dinheiro público iria prioritariamente para a educação. Todos sabemos disso.
Mas teremos que esperar esses jovens chegarem ao topo.
Mas...
Mas ainda somos o país do mas,
o mas é nossa marca de ódio,
o mas é nosso disfarce para o ódio,
o mas permite que o assassino cruel se sinta bem -- e do bem -- ao apunhalar aquele que odeia,
o mas é a grande mancha que revela a hipocrisia de nossa alma.
Nas demissões:
você é excelente, acrescentou muito ao nosso grupo, mas...
Nos relacionamentos:
gosto de você, que foi importante para mim, mas...
No nono mês o médico diz:
você sabe que sempre fui favorável ao parto normal, mas...
Nas adoções:
não temos nada contra crianças maiores, mas...
Nos negócios:
sou correto, mas...
Enfim, não tenho nada contra:
... os negros, mas
... os gays, mas
... os pobres, mas
... os evangélicos, mas
... os nordestinos, mas
Quando votarem diretamente, os jovens vão pôr o dinheiro sim na educação, e ensinarão suas crianças a dizer de cabeça erguida o que pensam, sem precisar das vergonhosas manchas de personalidade que caracterizam o nosso discurso do mas.
O país está mudando, mas
poucos veem o ponteiro das horas se mexer.
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Do autor do Blog, disponível em amazon.com.br |
2 comentários:
Muito bom!
Amém, mas a falta de investimento na Educação e a total ausência de valores familiares ainda condenam os jovens a um futuro sombrio, salvo exceções
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