Em meio aos brasileiros descontentes que chegaram a bater panelas, e até mesmo entre pessoas racionais, o que muito se escuta é que uma chance de ir para o Canada, Portugal ou os Estados Unidos são as melhores soluções para a crise brasileira.
Se as razões do sonho da emigração fossem a consciência de que as fronteiras não deveriam existir, a partir de uma sensação de pertencimento universal, isso seria muito positivo e até elogiável. Mas os motivos são menores. Do lado paneleiro, o temor (aliás, tremor) de que o barbudo volte. Do outro, a desesperança de quem não consegue ler a sequência de acontecimentos do país.
O Brasil vive há cerca de dez anos o momento histórico mais fundamental na construção de sua excelência civilizatória. Poucos percebem isso. A evolução dos instrumentos de fiscalia, tanto no plano legal quanto tecnológico, veio a coincidir com o afunilamento dos concursos públicos que traz um novo corpo de delegados, promotores, procuradores e juízes, jovens com outros valores e com mais inteligência, pouco inclinados a arriscar a vida que possuem a troco de um enriquecimento irracional e antiético. Os que passam hoje nesses concursos, têm aspirações mais altas do que o simples desejo de enriquecer. É curioso como nesse particular de valores velhos juízes, procuradores e delegados, em grande número, tais como os políticos em geral, se assemelham aos traficantes de qualquer morro carioca: arriscam tudo unicamente por ganância e ostentação.
Óbvio que essa busca fútil de riqueza continuará a ser um valor no país. Nem todos os jovens gostam de ler e estudar, embora muitos tenham talento para ganhar dinheiro. Mas esses não estarão nos quadros policiais e do judiciário, e terão dificuldade para controlar o Estado. Essa transição ainda levará algum tempo. O conflito de gerações está disseminado pelas várias instâncias dos três poderes e os que ainda vivem do velho Brasil usam a influência e os cargos que têm para reagir e tentar manter o statu quo, tentando preservar as possibilidades de corromper e ser corrompido, legislando e decidindo a favor de bancos (vide post anterior) e outras forças econômicas em prejuízo dos que mais sofrem na sociedade.
O país experimenta um processo catártico, de purgação mesmo. Tal como numa cirurgia, a visão das vísceras assusta, mas a retirada do tumor é etapa fundamental para a saúde daquele que está doente.
Não há beleza nesse quadro. Muitos erros e injustiças se espalham aqui e ali. É o hegeliano processo histórico em seu lento, quase imperceptível movimento.
Começa a se formar uma era em que a educação que pedimos será consequência natural do redesenho do Estado, e nossos meninos poderão construir um país em que venham eles mesmos a decidir diretamente seus destinos.
Que saiam os apavorados. E assim que o último sair, poderemos acender a luz.
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2 comentários:
Em dias como este, no qual uma absoluta desesperança me atinge no que concerne ao meu país (pobreza, sucateamento dos serviços públicos e, o que mais me chocou hoje, a literal queima da nossa cultura no Museu), seus textos acendem a luz em mim, meu querido professor.
Muito esclarecedor Alvinho !!
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