Sim, é preciso ser Charlie.
Isso não quer dizer que os que são
Charlie concordem com todas as sátiras feitas sobre tudo e sobre
todos. Mas concordam com a máxima do iluminista francês Voltaire, o
famoso “não concordo com uma só palavra do que dizes, mas
defenderei até à morte o direito de dizê-las”. É justamente a
defesa do direito de os outros serem diferentes de nós.
Liberdade total é a lei do mais forte,
é a selvageria. Igualdade total é a proibição da diferença, é a
morte da liberdade. Isso é questão de lógica, já estava no
Emílio, de Rousseau.
O ponto de equilíbrio entre a
liberdade e a igualdade define a qualidade de vida material e
psíquica de todos os cidadãos, e não pode ser decidido por
políticos. Diz respeito a cada um de nós.
Todos são conscientes de que na Síria,
no Iraque, no Afeganistão, no Mali, ocorrem chacinas que matam muito
mais do que o que se viu na França. E a notícia dessas mortes
“menores” geralmente não passa de um pé de página de jornal.
Isso, é claro, revolta jovens europeus muçulmanos que, sem emprego,
e sentindo-se discriminados, sem autoestima na França, na Alemanha,
na Inglaterra, por exemplo, são terreno fértil para a revolta.
Ensina Maquiavel, “os homens lutam contra o príncipe quando não
têm mais nada a perder”.
Essas rebeldias individuais, tanto
quanto a criminalidade no Brasil, têm sim uma raiz de exclusão
social, causada principalmente pela ganância dos políticos que
entram no poder para fazer do dinheiro público um balcão de
negócios para si e para seus grupos. Estivéssemos nós a decidir o
uso dos recursos, pondo-os na educação e na saúde, e precisaríamos
de menos dinheiro para segurança.
Só a democracia direta pode reverter
esse processo.
Charlie Hebdo é um jornal sem ligação
com grupos econômicos, um jornal que satiriza a tudo e a todos,
indiscriminadamente. É voz direta. Rimos de algumas coisas e
reprovamos outras. Tal como na democracia direta. É a liberdade
mesma de expressão. E nisso esse atentado se difere de todos os
demais vistos até agora.
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