Câmara de tortura. Embora o nome hoje traga à mente a clássica banda de heavy metal, iron maiden é como os medievais chamavam essa câmara de tortura em formato de mulher.
Uma das músicas mais pedidas pelos fãs do metal chama-se hallowed be thy name (santificado seja o vosso nome), em que um condenado não compreende por que Deus o deixa morrer. Infere-se que o infeliz não tinha consciência de que suas escolhas e ações o levariam à forca.
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Iron Maiden, Hallowed be thy name |
Há muita gente, principalmente aqui no Brasil, que vê o gênero heavy metal como um barulho sem sentido. É um público habituado a não pensar, que deseja sempre a nota musical esperada, óbvia, e a letra explícita, objetiva. Não percebe a sugestão, o convite a uma outra perspectiva de imagem.
Até que tenhamos uma revolução educacional, tais brasileiros nunca vão compreender as narrativas que estão por trás dessas sugestões. E é por isso que são intolerantes: veem o sol nascer aqui e se pôr ali... como pode alguém enxergar algo diferente?
Exemplo triste disso é o nosso ministro das relações exteriores, Ernesto Araújo, que em seu blog do dia 2 de março amaldiçoou a "política de consenso" que regeu a chancelaria brasileira nos últimos 25 anos. Ele se crê um cavaleiro andante, que vai aonde o perigo está, para libertar a donzela (no caso, povo venezuelano) e lançar o Brasil numa cruzada definitiva contra o chavismo ameaçador.
Diz o nosso chanceler:
"O presidente Bolsonaro e eu estamos, sim, rompendo esse consenso infame. Estamos rompendo com a tolerância irresponsável que ajudou a acobertar os crimes do regime chavista".
Ora, esse "consenso infame" sempre consistiu na tradição de não intervir na política interna de nossos vizinhos. Não interferimos quando a direita no Paraguai tirou Lugo do poder. Se a Venezuela tem problemas, o máximo que podemos oferecer é servirmos de mediadores para buscar um consenso, se a isso formos solicitados.
É fácil ver que Maduro está bem distante de ser um modelo de estadista democrático, respeitador dos direitos humanos. Mas a perspectiva que nos interessa de perto é a que enxerga Donald Trump como um conservador à moda antiga, oposto tanto aos liberais republicanos quanto aos democratas: um protecionista que vai tentar fazer sempre o melhor negócio para si, ainda que isso custe a vida dos outros e que o planeta se acabe.
Trump se aproveita da atual crise venezuelana para usar Brasil, Colômbia e outros, e assim atingir seus objetivos, talvez sem custos. O petróleo ainda é importante, e ele sabe que é possível utilizar vassalos da geopolítica -- nós, brasileiros e colombianos -- para que sejam sempre preservadas as reservas petrolíferas na zona de influência norte-americana. No fim, a doutrina Monroe é o que representa o slogan de campanha America first.
Diz o nosso chanceler:
"O presidente Bolsonaro e eu estamos, sim, rompendo esse consenso infame. Estamos rompendo com a tolerância irresponsável que ajudou a acobertar os crimes do regime chavista".
Ora, esse "consenso infame" sempre consistiu na tradição de não intervir na política interna de nossos vizinhos. Não interferimos quando a direita no Paraguai tirou Lugo do poder. Se a Venezuela tem problemas, o máximo que podemos oferecer é servirmos de mediadores para buscar um consenso, se a isso formos solicitados.
É fácil ver que Maduro está bem distante de ser um modelo de estadista democrático, respeitador dos direitos humanos. Mas a perspectiva que nos interessa de perto é a que enxerga Donald Trump como um conservador à moda antiga, oposto tanto aos liberais republicanos quanto aos democratas: um protecionista que vai tentar fazer sempre o melhor negócio para si, ainda que isso custe a vida dos outros e que o planeta se acabe.
Trump se aproveita da atual crise venezuelana para usar Brasil, Colômbia e outros, e assim atingir seus objetivos, talvez sem custos. O petróleo ainda é importante, e ele sabe que é possível utilizar vassalos da geopolítica -- nós, brasileiros e colombianos -- para que sejam sempre preservadas as reservas petrolíferas na zona de influência norte-americana. No fim, a doutrina Monroe é o que representa o slogan de campanha America first.
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Embora seja Ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo deveria ouvir Iron Maiden para ampliar sua leitura das relações internacionais. Sorte do Brasil que as altas patentes militares, de Mourão a Heleno, têm melhor formação, estão longe de representar o condenado de hallowed be thy name, e conseguem fazer com que Ernesto não empurre o país para uma câmara de tortura.
Um dia vamos decidir questões como essas diretamente, votando nós mesmos.
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Do mesmo autor do blog, disponível em www.amazon.com.br |
4 comentários:
Muito bom, como sempre!!!
Uma pontual reflexão, infelizmente estamos nessa corda bamba que foi esticada pelo ódio político levando-nos a tempos de desgoverno, haja heavy metal, da-lhe Iron Maiden na veia.
Muito oportuna está reflexão .
Perfeita analogia .
Parabéns prof. Alvaro. Analogia perfeita de quem sabe muito de heavy metal, política e ser humano.
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